O jogo

De repente um barulho no sótão o fez estremecer, ele já não sabia onde correr, aquilo parecia estar em todos os lugares o chão da casa começou a estremecer, as paredes pareciam a ponto de desmoronar com os abalos, ele já estava apavorado e sem forças, quando ouve uma voz:
- Agora você pagará pelo que sua dívida.

O telefone toca assustando Marina, que marca o ponto no livro e vai correndo à sala atender.
- Alô! Diz Marina, um tanto contrariada de ter parado sua leitura.
- Oi, aqui é a Priscila, tudo bem?
- Huumm, não conheço nenhuma Priscila, tem certeza que ligou para o lugar certo?
- Não conhece?! E desligou o telefone.
Marina ficou pensativa, mas tinha certeza de não conhecer nenhuma Priscila, não uma que ligasse pra ela no meio da noite.
Marina pegou umas bolachinhas e subiu correndo para o quarto para terminar o livro, mas ao pega-lo, a campainha tocou.
- É hoje que não termino de ler. Resmungou.
Abriu a porta, mas não viu ninguém ali. Só podia ser uma brincadeira, e quando ia fechar a porta, sentiu um calafrio percorrer seu corpo, que se arrepiara da cabeça aos pés. Uma sensação horrível, Marina olhou em volta pra confirmar se havia alguém ali, e fechou a porta.
Decidiu tomar um banho, já que fora interrompida da leitura, assim mantinha sua curiosidade e suspense pelo final de seu livro, ela adorava livros de terror, e sempre ficava pensando no final.
Após alguns minutos no chuveiro quente, muitos minutos na verdade, ela estava totalmente compenetrada em seus pensamentos, quando escuta um barulho no banheiro, desliga o chuveiro pra ouvir melhor, mas ele não se repete. Então ela sai do chuveiro, olha em volta, mas estava sozinha, não havia nada ali. Ou quase nada.
Quando Marina olha para o espelho, ficou branca, precisou se encostar na parede para não cair com o que vira. Porém quando olhou novamente para o espelho já não havia mais nada. A frase que ela havia visto: “Você não conhece nenhuma Priscila?” escrita no vapor de água condensado no espelho, não estava lá, agora era apenas seu vulto totalmente distorcido pela condensação no espelho.
- Essas histórias estão mexendo mesmo comigo! Falou com um sorrisinho, após ter passado o susto inicial.
Então ao limpar o espelho para acabar de vez com essa imaginação fértil, Marina cai sentada no chão frio, o que vira no espelho a fez fica paralisada ali por alguns segundos até sair correndo para seu quarto, nem se preocupou em pegar roupa ou toalha, correu nua mesmo e se enfiou embaixo do edredom. A imagem refletida no espelho não era sua.
Marina, assustada, começou a ouvir passos no corredor, passos firmes e calmos vindo em direção ao quarto. Continuava embaixo das cobertas, tentando tapar os ouvidos para não ouvir os passos. Porém os barulhos pararam. Não se ouvia mais nada, o silêncio gutural da casa vazia, tomara conta do lugar novamente. Marina estava quase criando coragem de tirar a cabeça pra fora da coberta, quando sente uma respiração fria em seu pescoço, uma mão tão gélida que a fez sentir um calafrio que surgira na espinha, aquilo que a tocava era tão frio parecia ter penetrado em sua carne. A jovem pulou pra fora da cama. Agora, Marina estava nua, de pé em frente à sua cama, olhando para uma jovem que estava vestida com um de seus vestidos, e a olhava com um olhar de satisfação, como se tivesse acabado de ganhar um presente. Nesse momento Marina lembrou-se de Priscila. Uma jovem que ela havia conhecido em uma festa. Ela e seus amigos estavam bêbados, e deram carona para essa jovem, mas no meio do caminho resolveram fazer uma aposta com ela. Tiraram suas roupas a deixando nua, e disseram que se ela os encontrasse, eles lhe dariam suas roupas e voltariam nus pra casa, era uma espécie de jogo. Depois disso, nunca mais tiveram notícias da garota.
No dia seguinte, a mãe de Marina chegando de viagem, entra no quarto da jovem e a encontra de pé, nua olhando fixamente para uma folha de jornal sobre a cama. Na página havia a reportagem de uma jovem que havia sido encontrada em uma construção, a jovem havia sido violentada e assassinada. E na página havia escrito à mão e em letras grandes.
“Pronto, te encontrei”.

Ossos do ofício


Estava eu indo para minha casa após mais um dia de trabalho, era sexta-feira e como de costume fui a um barzinho com os outros advogados e pessoal do escritório. Eu ia encontrar minha noiva, mas ela me ligou de última hora desmarcando, dizendo que estava numa cidadezinha vizinha pelo trabalho, e passaria a noite lá porque não tinha como voltar, achei estranho ela não ter comentado que iria pra lá, mas tudo bem, decidi ir pra casa descansar.

Mas no caminho me bateu uma sensação de que eu estava sendo vigiado, sabe aquela sensação de que tem alguém te olhando, que está atrás de você te acompanhando, você olha e não vê nada nem ninguém? Era isso que eu estava sentindo, e reparei que essa sensação estava me acompanhando o dia todo, mas nem me preocupei, “É besteira de minha cabeça, cansada do trabalho da semana!” então liguei o rádio para distrair a cabeça e parar de pensar naquela sensação estranha. Mas a sensação não passa, e estranhamente meu CD parou de tocar, e mudou pra uma estação de rádio. Achei estranho, pois meu rádio não tinha problema nenhum, e o mais estranho era que o rádio estava noticiando coisas ocorridas há um ano. Então mudei a estação e em toda estação que parei, estava tocando músicas de mais ou menos um ano atrás também, parecia que meu rádio estava sintonizado com uma freqüência vida do passado, vinda do ano anterior. Deixei assim e fui curtindo, quando começa a tocar uma música mais animada, e sinto como se tivesse alguém se mexendo no banco de trás do carro, como se estivesse dançando, e vi um vulto pelo espelhinho do carro, me assustei, olhando pra trás, mas não vi nada. Não tinha ninguém ali, apenas eu e a música já bastante tocada, pois fez sucesso essa música entre os jovens. Mas o carro parecia balançar, continuava com aquela sensação de que tinha alguém ali.

Logo cheguei em casa, morava sozinho em uma casa, consideravelmente grande e confortável. E pelos acontecimentos dessa noite, esse conforto seria útil para descansar. Então fui tomar um longo banho, e quando estou terminando ouço o rádio ligar na sala, me assustei, mas pensei que fosse minha noiva que conseguiu voltar e veio me fazer uma surpresa. Me enrolei na toalha e desci para vê-la, mas quando chego na sala não vejo ninguém ali, e aquela mesma sensação de que tinha alguém ali, se mexendo, como se estivesse dançando com a música. Procurei a casa inteira, chamei e ninguém respondeu, então desliguei o rádio, pensando que pudesse ser alguma função que eu tinha ativado se saber. Mas assim que o desliguei, ouvi uma batida na mesa atrás de mim, como se alguém tivesse dado um soco na mesa, e um belo soco, o barulho foi alto e forte, um soco de raiva. Virei-me assustado, mas não tinha nada nem ninguém ali, eu estava sozinho na casa.

“Pronto, estou tendo alucinações agora, preciso mesmo descansar.” Então subi pro quarto e fui dormir. Mas alguns minutos após eu ter deitado, escutei uns barulhos como se estivessem arrastando alguma coisa pelo corredor de casa, que levava ao quarto, me assustei e fui olha o que era, encostei o ouvido na porta, e sentia que, o que quer que seja, estava se aproximando do quarto, mas o barulho parou ao chegar próximo à porta. Quando desencostei o ouvido da porta para abri-la, ouvi uma batida enorme na porta, quase arrancando-a do lugar, quase cai sentado com o susto, já estava pensando em ligar pra polícia, deveria ter alguém na casa, e foi quando comecei a ouvir gritos abafados e gemidos na sala, abri a porta lentamente pra ver o que acontecia, mas não vi nada, e o barulho persistia, gemidos de dor, gritinhos abafados de sofrimento. Entrei pro quarto e me deitei, “Isso é alucinação, eu estou muito cansado, é isso, vou dormir e tudo passará”. Mas esses barulhos continuaram por horas, quando pararam, mas a pausa durou apenas alguns minutos, logo ouvi novamente o barulho de arrastar, mas logo depois ouvi um grito aterrador, um grito de dor, ódio e angústia, tudo misturado, um que me fez arrepiar da cabeça aos pés, e nesse momento olhei para o relógio, eram 2h da manhã, e junto com o grito, comecei a sentir um cheiro horrível de algo queimando, parecia carne queimando, mas não era bife ou carne de churrasco, era um cheiro horrível de sebo, de carne, de cabelo, tudo misturado, um odor que me causou ânsia de vomito.

Os barulhos logo pararam, mas o odor permaneceu na casa a noite toda, mal dormi, apenas cochilava e logo acordava assustado.

Pela manhã me levantei, estava tudo calmo, nenhum barulho na casa, nenhum odor estranho nada, tomei um banho e fui tomar café, foi quando minha noiva me ligou reclamando que eu não tinha ido encontrá-la, ela disse que não tinha me ligado coisa nenhuma, e que na verdade tentou me ligar a noite toda, mas eu não atendia. Achei estranho e disse que passaria na casa dela a tarde. Então algo no jornal quase me faz cair de costas, fiquei parado olhando a notícia que dizia.
“Hoje faz um ano da morte de Juliana, um crime bárbaro, onde essa jovem foi arrastada pelos cabelos em um canavial, violentada e jogada pra ser queimada viva, ao que se sabe, foi exatamente as 2h da manhã quando ela foi jogada no fogo que queimava a cana para a colheita no dia seguinte, e apesar de machucada ela estava viva e consciente. E seus assassinos conseguiram pena mínima, pois seu advogado havia conseguido desmerecer os testemunhos dos cortadores de cana que testemunharam, e tentaram salvar a garota do fogo.”

Esse advogado era eu.